terça-feira, 12 de maio de 2009

Álbum de Recordações Literárias & Artísticas

É inevitável no ofício de escrever haver muita coisa que se perde. Acho mesmo que é desejável que assim aconteça, pois de certo modo isso liberta-nos. Ademais, há em todas as nossas vidas uma espécie de fase infantil da escrita. É quando escrevemos poemas e cartas de amor, ou seja, aquelas cartas a que Pessoa chamava ridículas. Por serem demasiado íntimas ou literariamente frágeis, essas coisas convém que fiquem guardadas num lugar à parte. Não são portanto essas coisas que este postal aqui visa, mas antes o registo factual de alguns momentos que foram o produto de um certo "amadurecimento intelectual", seja lá o que fôr que isso significa.

Do capítulo das minhas "recordações literárias" faz parte a passagem pelo DN Jovem quando tinha entre 17 e 25 anos de idade, bem como o período posterior, até cerca de 1994, em que esporadicamente concorri a alguns prémios literários nacionais.Tirando as minhas edições de autor, nunca publiquei nenhum livro de poesia. Uma das razões foi talvez a de me terem perdido o rasto aqueles que poderiam estar, na época, eventualmente interessados em publicar-me. Mesmo assim acho que não. Portugal é um país de poetas e eu vim a ser, apenas e acidentalmente, português. Fazer poesia não é um objectivo de vida: é fado; é como um respirar que, enquanto é, não se pode evitar.
Lembranças dos Prémios Literários
Não sei ao certo a quantos prémios literários concorri, tendo-o feiro unicamente na modalidade de poesia. Não foi seguramente mais de uma dezena. Tenho alguns contos publicados, e textos como é o caso de As Três Idades, publicado em 1990 pela Editorial Notícias na sua Antologia DN Jovem. Mas a prosa nunca me atraiu tanto como a poesia. Nunca me aventurei por exemplo a escrever nenhum romance ou novela. Se o fizesse não chegaria aos calcanhares de um Lobo Antunes, por exemplo, e por isso quando penso num romance ou novela, opto por lê-lo.
(carregue para descarregar o texto As Três Idades)

Elogio do Ser Imóvel, Distinção do Prémio Bocage 1989;
(Jornal A Capital, 5 de Janeiro de 1989; carregue sobre a imagem para ampliar)


- Prémio Carpe Diem 1990;
(Jornal Região de Leiria, 31-08-1990; carregue sobre a imagem para ampliar)
(Revista Carpe Diem, nº 0, Ano I, Inverno de 1992; carregue sobre a imagem para ampliar)

- Poemas Fractais, Prémio Carpe Diem 1991
(Jornal A Voz de Alcobaça, 31 de Dezembro de 1991; carregue sobre a imagem para ampliar)

Fractal, Prémio de Revelação de Poesia Ary dos Santos, 1993. Guardei boas memórias da cerimónia de entrega, de um jantar com o Presidente da Câmara de Grândola, Fernando Travassos, e de uma noite muito agradável numa colectividade local, em vésperas de eleições autárquicas.



- Um Nome para a Poesia, Menção Honrosa do Prémio Cidade do Funchal/Edmundo Bettencourt 2008.




O fascínio pelo Teatro
Há ainda nestes períodos um projecto no qual me envolvi enquanto membro dirigente da AEFCT (Associação dos Estudantes da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNL) entre 1989 e 1991 e que me foi extremamente grato e marcante. Era então presidente da Associação o eborense Mário Figueira, nuna direcção pela primeira vez eleita após anos sucessivos do incansável "José Carlos", o "rapaz das fotocópias", que vinha desempenhando abnegadamente essa função desde meados da década de oitenta. Cheguei ao pé dele e propus-lhe organizar um Curso de Teatro para os estudantes da Faculdade. Ele concordou e eu empenhei-me então a fundo no projecto, tendo conseguido obter para ele os necessários financiamentos, vindos em partes quase iguais do Instituto Português da Juventude e da Fundação Calouste Gulbenkian (na altura foram cerca de 3 mil contos!, o que era fantástico para uma Associação de Estudantes do Superior com pouca ou nenhuma experiência nestas coisas). Foi aí que conheci o actor Mário Viegas, a quem convidei para assumir a coordenação artística do curso de teatro (estava então o Mário Viegas no Politeama a representar "Fim de Festa" de Samuel Beckett, e comigo esperaram por ele no camarim a Maria João Simas, a Sandra Caeiro e, salvo erro, o grande madeirense e meu amigo Tomás Barros Ramos).
Iniciado o curso, que contemplava as várias disciplinas da arte dramática,como por exemplo as máscaras (de que foi professor o magnífico Filipe Crawford), e ainda um conjunto de seminários abertos a toda a escola, durante os quais tive oportunidade de conhecer pessoalmente, entre outros notáveis da nossa cultura, a inesquecível Natália Correia, o brilhante maestro e comunicador António Victorino d'Almeida, o encenador Filipe La Féria, o sonoplasta Pedro Laranjeira, a actriz Maria do Céu Guerra, e o actor, encenador e dramaturgo Helder Costa. Os registos fotográficos desses eventos não os tenho infelizmente, e julgo que o nosso incansável fotografo à época, o enérgico Luís Miguel Nunes, terá já perdido esses negativos, entre as centenas de fotografias que na altura fazia, mas que jamais conseguia relvelar, por insanável falta de "tempo". A fotografia digital ainda não tinha chegado, e todos sabemos como o "tempo $" escasseia quando somos estudantes...
O curso de teatro, que teve mais de uma centena de inscritos, foi acompanhado até ao seu término pelo meu colega de engenharia do ambiente Rui Frazão, que a ele se dedicou de forma exemplar e apaixonada. Houve uma representação final em Almada pelos alunos do curso, a que infelizmente não pude assistir por razões pessoais. Mas soube pelo Rui Frazão que correra tudo muito bem, graças ao apoio, entre outros, do encenador almadense Joaquim Benite.
O que ficou deste primeiro curso foi certamente o gérmen do teatro numa escola de ciências e tecnologias. Perdi depois o rasto às pessoas e aos formandos desse primeiro curso. Iniciara a minha carreia profissional, como engenheiro do ambiente, ainda em 1991, e o tempo e as viagens exigiam demasiado de mim. O que sei é que o vírus ficou desde então, e dele não existe melhor prova do que o NNT, O Novo Núcleo de Teatro da AEFCT. Parece-me ter valido a pena.
Devaneios pela Pintura

Nunca aprendi Pintura e sempre fui um verdadeiro desastre no Desenho. Sucedeu porém que sempre me fascinaram as cores e as imagens, bem como as biografias dos grandes pintores europeus cujas obras gosto de admirar nas muitas visitas que vou fazendo a museus e centros de exposições um pouco por todo o lado. E talvez por isso tenha pegado pela primeira vez, em 1982, num pincel, num pedaço de madeira e numas bisnagas de óleo que comprara (a que preço naquele tempo!) na papelaria do sr. José Carvalho, em Alcobaça. E tenha começado a espalhar as cores, procurando dar algum significado ao que ia pintando.

Linhas humanas - I
Acrílico e betume da Judeia sobre tela, 40x40cm, 2013

 Linhas humanas - II
Acrílico e betume da Judeia sobre tela, 50x70cm, 2013
 Ligações
Acrílico sobre tela, 65x55 cm, 2008

Casa assassinada
Acrílico sobre tela, 40x40 cm, 2013

A engrenagem
Acrílico sobre tela, 100x81cm, 2007, Colecção de Teresa Filipa Rodrigues



Os gatos
Acrílico sobre tela, 100x80 cm, 2018, Colecção pessoal da dra. Mariana Ferreira


Wedding
Acrílico sobre tela, 100x88cm, 2018, Colecção pessoal da dra. Mariana Ferreira


O pianista
Acrílico sobre tela, 100x60 cm, 2018, Colecção do dr. Paulo Salazar
~
O grito do grito, 2020, óleo e acrílico sobre tela, 65 x 92 cm,
colecção pessoal do dr. Paulo J. Salazar

O Burburinho, 2024, acrílico sobre tela, 95 x 65 cm,
colecção pessoal dos drs. Inês Ferreira e Dan Tofan

Desencontros, 2024, acrílico sobre tela, 100 x 70 cm,
colecção pessoal de Raquel Rodrigues

"Fragmentação", 2024, 160 x 95 cm
Colecção particular do dr. Paulo J. Salazar


O projecto cultural do Bazar das Monjas de Coz

Sempre desejei poder viver na terra onde nasci, uma pequena aldeia com uma grande história situada nos arredores de Alcobaça. Cós ou Coz é o seu nome, e nela vivi até aos doze anos de idade. Nela fiz, ainda antes da Revolução dos Cravos, os exames da 4ª Classe, que na altura decorriam em dois dias. Escrevi em 2007 um pequeno texto sobre Cós que podem ler aqui. Em 2004 surgia, depois de uma série de acontecimentos trágicos, a oportunidade de realizar o sonho. À minha mulher, a Raquel Romão, a quem recentemente falecera a mãe, e a mim próprio, ainda abalado pela morte ainda mais recente do meu querido pai, conveio o destino que tivéssemos a possibilidade de desenvolver em Cós um projecto cultural privado, o Bazar das Monjas de Coz, apostado na defesa e valorização do riquíssimo património histórico e cultural da freguesia onde ambos nascêramos. Criámos em 2007 o PRADBA, o Prémio de Revelação Artística D. Benta de Aguiar, em homenagem a uma das abadessas mais importantes do Mosteiro de Santa Maria de Coz, cuja primeira edição foi um enorme sucesso. Aberto entre Maio de 2004 e Julho de 2009, ou seja, durante mais de cinco anos, o Bazar das Monjas viria a suspender as suas actividades desde então. A história do Bazar das Monjas, bem como aquela que, desde 2000, vivi em Alcobaça, representou uma experiência sociológica de grande relevo, e que decerto me marcará para o resto dos meus dias.
Doutorado desde 2003 em Engenharia do Ambiente, residi em Alcobaça e Cós durante estes dez anos (de 2000 a 2009) sem nunca aí (ou em qualquer outro local do Distrito de Leiria) ter exercido qualquer actividade profissional, o que tentei por mais do que uma vez. Vi-me então forçado a concluir que os meus conhecimentos profissionais não faziam qualquer falta nem ao Concelho nem ao Distrito, nem mesmo à Freguesia, à qual mais do que uma vez ofereci graciosamente os meus serviços para ajudar a resolver alguns dos seus problemas ambientais. O Sr. Álvaro Santo, presidente da Junta, nunca poderá negar isto à minha frente. Durante dez anos caminhei para Lisboa, diariamente de início, depois com cada vez menos frequência (à medida que as oportunidades de trabalho iam rareando, em parte devido à "crise" económica, e em parte devido à distância, que me colocava fortes limitações orçamentais, e de tempo) até que, em 2008, me restavam apenas algumas horas de docência universitária, distribuídas por um ou dois dias na semana. Com um ordenado ilíquido de pouco mais de 800 euros, 250 dos quais ficavam "na estrada" em gasóleo e portagens, para não falar do desgaste do carro (ir para Lisboa de autocarro ou comboio esteve sempre fora de questão, pois leccionava turmas pós-laborais, e à noite, como é sabido, não há infelizmente alternativas de transporte público); com uma filha a estudar no ensino secundário, e com a minha mulher limitada aos "rendimentos do Bazar" (na realidade, o Bazar causava-nos um prejuízo mensal constante, já que na maioria dos dias a "caixa" não ia além dos 20 euros, e havia todos os meses que pagar electricidade, segurança social, contabilista, etc., etc.), a situação começava a tornar-se insustentável.
A partir de bem cedo passei a olhar para a minha vida "alcobacense" e "cosense", e para as contingências várias, em regra desagradáveis, que se lhe iam associando, como uma espécie de "experiência sociológica da ruralidade", um curso verdadeiramente avançado de formação "no terreno", que me permitiu aprender imenso sobre a natureza humana, sobre a falácia dos romantismos ligados à beleza da "aldeia" e da "vida rural" (coisas que, em teoria, eu já conhecia, por exemplo de alguns contos que lera do magnífico José Cardoso Pires), e sobre a realidade económica, social e política locais. Tratou-se de uma narrativa destinada a convencer-me de que tinha valido a pena ter feito o que fiz e passado pelo que passei, e a forma racional de tentar viver com a situação. É por isso que digo que, depois desta "experiência", me orgulho hoje de possuir o conhecimento necessário para compreender as exactas razões do atraso económico e político de Portugal. Convenço-me que poucos saberão do assunto tanto quanto eu., sendo certo que paguei pela aprendizagem um preço bastante elevado...
Alguns, mais benévolos, acusar-me-ão de ser demasiado orgulhoso. Tipo "Aquele gajo, quem é que ele julga que é!?" Obviamente tais criaturas não me conhecem, e sinceramente não me interessam. O povinho que anda pelas ruas das "nossas aldeias" é o mesmo que se diverte pela calada da noite a matar os cães dos "vizinhos" (não perdoarei à besta humana que matou o meu cão Gulliver, que ainda resistiu uma vez, mas que à segunda sucumbiu à dose de veneno ministrada) É desta forma que o "povo da aldeia," "bonzinho por natureza", agradece aos "filhos da terra" que só lhe quiseram bem. Todas as obras que fizemos, e que ainda foram bastantes, bem como o emprego que gerámos durante todo esse tempo, tiveram sempre por base a mão-de-obra local. Não esquecerei por isso os múltiplos vexames por que a minha mulher, a minha filha e eu passámos durante esse tempo. Se isto é ser "orgulhoso", então o que será viver com dignidade? Aturar alcoólicos "bonzinhos por natureza" que nos empestam as casas de banho de merda e mijo (literalmente); que nos vomitam no chão enquanto riem alarvemente; que nos acordam, a meio da noite, com algazarras e gritos, e que bebem sem sequer pagarem o que beberam, não é bucolismo algum. Experimentem e logo vêem o que estou a dizer. Não me interessam opiniões de quem nunca teve, ou tem, qualquer experiência semelhante à minha. O mínimo que se pedia era pois que as ditas "entidades públicas locais" reconhecessem o nosso trabalho, ao invés de o invejarem grosseiramente e de, em silêncio, tentarem fazer de conta que ele nunca existiu. Não esquecerei, por exemplo, a boçal tentativa de apagamento da memória que foi a exclusão dos nossos nomes e das referências ao Bazar das Monjas na página de Cós da Wikipedia, por nós próprios criada em 2006. Não foi nenhum bêbedo ignaro que fez isso. Obviamente tratou-se de gente com "outros estudos"...
Várias vezes durante esse tempo perguntámo-nos: que mal fizemos nós a esta gente!? E não encontrámos resposta, porque simplesmente nunca fizemos mal nenhum, muito pelo contrário. Não ficámos a dever um centavo a ninguém que para nós tenha trabalhado, e pegámos sempre a pronto, em numerário, e generosamente. Nunca me importei de ajudar alguém a pesquisar algo na Internet que nós pagávamos, a preencher um impresso, ou mesmo a fazer um curriculum vitae. Tal como a minha mulher nunca se fez pagar pelas múltiplas visitas que guiou ao Mosteiro, ou pelas inúmeras vezes que assistiu gente em dificuldades da Freguesia. (Ela não sabe disto que estou aqui a escrever, pois o "orgulhoso" sou eu e não ela, felizmente...) Descobri portanto, com um saber amargo de experiência feito, que as ditas "entidades públicas" são corrompidas a partir da base, a partir do "zé povinho" das sardinhadas e das castanhas com água-pé, e não pelos políticos que acima delas actuam e que delas se aproveitam. É de "baixo" e "de pequeno" que começam a corrupção e a desonestidade. Quanto teriam pago alguns sociólogos por estes ensinamentos da "experiência"...
Mas nada que a teoria não me tivesse já ensinado, ao ler a História de Portugal que vai pelo menos desde Camões a Jorge de Sena. Ao fim de 10 anos de "experiência sociológica" regressei portanto a Lisboa (donde, a bem dizer, nunca devia ter saído), praticamente falido mas muito mais lúcido e mais sábio. Aprendemos ao longo de toda a vida. Agora, quando ouço falar dos atrasos do país e da corrupção, já não sinto qualquer estranheza, ou mesmo exaltação da vontade. Um ano depois de ter deixado a terra onde nasci, e para onde fui viver erradamente convencido de que podia ajudar a melhorá-la, sinto apenas tristeza e melancolia. E pena daquele pequeno pedaço de terra que herdei do meu avô, onde não me deixaram construir uma casa... por causa do "PDM", embora houvesse uma vivenda de cada lado dele, e uma estrada municipal à sua frente. Para alguns neste país, os que são enteados, a lei é mesmo para ser cumprida.
Textos publicados no DN Jovem
Ficam aqui, ao acaso, alguns dos textos em prosa e poesia que consegui conservar até hoje e que foram publicados no DN Jovem, entre 1988 e 1991. Para os ampliar, carregue sobre eles.




























segunda-feira, 11 de maio de 2009